Hansen lança obra incontornável sobre literatura brasileira

'Agudezas Seiscentistas' é o primeiro volume de uma trilogia do professor, publicada pela Edusp

28/09/2019

Em O Estado de S. Paulo

Por Wilson Alves-Bezerra

A pesquisa universitária de literatura é recentíssima no Brasil. A área de teoria literária e literatura comparada foi criada apenas no ano de 1961. Daí se entende o caráter fundador de um livro como Formação da Literatura Brasileira – Momentos Decisivos – 1750-1880, de Antonio Candido, publicado em 1959. Nele, partindo da noção de sistema literário – entendido como articulação de escritores, leitores e meios de circulação – Candido decide colocar-se, como ele diz, “no ângulo dos nossos primeiros românticos e dos críticos estrangeiros que, antes deles, localizaram na fase arcádica o início de nossa verdadeira literatura”

Estava configurado o que Haroldo de Campos (1929-2003), trinta anos depois, chamaria, já no título de seu polêmico livro, de O Sequestro do Barroco na Formação da Literatura Brasileira: O Caso Gregório de Matos (1989). A crítica de Campos quanto à exclusão do Barroco no livro de Candido, e de autores como o Boca do Inferno e o Padre Vieira, baseava-se no que ele considerava uma concepção equivocada da história – kantiana – na Formação, pois lá partia-se da noção de encarnação de um questionável ‘espírito nacional’.

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Naquele mesmo ano de 1989, vinha a público outro importante livro, de João Adolfo Hansen (1942), A Sátira e o Engenho – Gregório de Matos e a Bahia do século XVII. Além de tratar da poesia satírica de Gregório de Matos e seu tempo, a partir de diligente pesquisa em arquivos da época, o livro reconstruía a primeira legibilidade dos poemas do Boca do Inferno, através dos códigos de seu tempo.

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Pois é ao século 17 – um período que tem início com a União Ibérica, em 1580, e se estende até 1750, com a morte de D. João V – que se volta o livro agora lançado por João Adolfo Hansen: três décadas depois de A Sátira e o Engenho, chega-nos Agudezas Seiscentistas e Outros Ensaios. O livro recolhe 14 importantes textos que são fruto de conferências, artigos acadêmicos e capítulos de livros, produzidos ao longo das últimas décadas pelo paulista de Cosmópolis. Neles, o autor explica uma e outra vez a fragilidade do termo Barroco, o qual ele define como “esquema formal, particular e datado” criado por Wölfflin, no século 19, como se “tivesse realmente existido no século XVII”

A etiqueta do Barroco não cola, quer nos dizer Hansen. É preciso, ensina-nos, recuperar o universo de referências do século 17, “estabelecer homologias entre representações discursivas, pictóricas e plásticas” e outras práticas letradas e não letradas. Suas fontes serão documentos os mais diversos, brasileiros e estrangeiros, manuais de retórica, poemas, esculturas, documentos legais, contratos, atas etc. Nas palavras de Alcir Pécora, outro especialista da área, os textos de Hansen são “verdadeiras lições inaugurais sobre vários assuntos negligenciados pela tradição brasileira”.

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O século 17 brasileiro recuperado por João Adolfo Hansen não é melhor ou pior que o 19 de Candido, pois não está em jogo nenhuma linha evolutiva. Com ele entende-se o funcionamento das artes e das letras de nosso período colonial. O livro ainda serve, como o dizem as organizadoras, para explicitar outro procedimento de seu autor “Hansen adota como estratégia da docência e da pesquisa a destruição da violência colonial que, transformada no Brasil por regimes políticos e econômicos distintos, vem se repondo como valor naturalizado.” (p. 14). Uma obra incontornável, que abre uma coleção de três tomos de textos do autor, os quais, reunidos, hão de consolidar o lugar ímpar de João Adolfo Hansen no pensamento brasileiro.

Leia o texto original na íntegra no Estadão

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